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Publicado 24/09/2017 - 19h14
Será que os professores ensinarão de forma diferente daqui a dez anos?
Infelizmente, meu palpite é de que a resposta para esta pergunta seja um rotundo “NÃO”. Apesar das contínuas alegações sobre uma revolução nas estratégias de ensino presencial, do advento dos cursos abertos online e da enorme expansão no uso de dispositivos tecnológicos (telefones celulares, computadores, tablets, etc.), na maioria das instituições de ensino superior ao redor do mundo prevalece a tradicional aula expositiva. Essa situação provavelmente se manterá por muitos anos, visto que para alterá-la seria necessária uma mudança de paradigma para centenas de milhares de professores, na tradição e na cultura das instituições de ensino superior e em todos os todos os aspectos do funcionamento institucional (auxílios para pesquisa, processos de contratação e promoção, entre outros).
Causa particular preocupação o impacto dessa inércia sobre as chamadas áreas STEM (acrônimo em inglês para ciência, tecnologia, engenharia e matemática), consideradas fundamentais para o desenvolvimento sustentável de qualquer nação. Há dados extensos que demostram uma preocupante falta de interesse por cursos de graduação STEM; além disso, apenas uma pequena parcela dos alunos matriculados nesses cursos concluem seus estudos. É muito comum observar altas taxas de reprovação em cursos de matemática básica, física e química, e muito fácil atribuir esse fraco desempenho à instrução recebida anteriormente nos níveis básicos de ensino. A deficiência na formação prévia é de fato uma realidade que levou à criação de cursos de nivelamento em muitas universidades. Contudo, uma parte substancial da responsabilidade deve ser alocada aos professores, que normalmente não adaptam suas estratégias de ensino às necessidades de seus alunos e ignoram os dados científicos que comprovam a ocorrência de uma clara melhora no desempenho estudantil quando novos métodos são empregados em sala de aula.
Uma meta-análise de 225 pesquisas diferentes mostrou que a taxa média de reprovação caiu de 34% com o ensino tradicional para 22% com o chamado “aprendizado ativo”; o desempenho dos alunos em provas similares melhorou aproximadamente 6% em sessões de aprendizado ativo (S. Freeman et al. PNAS 111, No. 23, p. 8410, 2014). O vencedor do Prêmio Nobel Carl E. Wieman comentou que “essa meta-análise representa um argumento poderoso de que qualquer faculdade ou universidade que fundamente seus cursos STEM em aulas tradicionais está fornecendo uma formação inferior aos seus alunos” (C.E. Wieman, PNAS, 111, No. 23, p. 8319). Wieman, comparando esse fenômeno à descoberta dos antibióticos, também argumenta que “no ensino de graduação STEM há a curiosa situação de que, embora métodos mais eficazes de ensino tenham sido fortemente demonstrados, a maioria dos cursos STEM ainda se baseia em aulas expositivas – o que seria o equivalente pedagógico das sangrias”. Por que isso ocorre e por que é tão difícil mudar?
Professores universitários, como quaisquer outros profissionais, são motivados por um conjunto de incentivos que incluem desde realizações pessoais (reconhecimento, diferentes níveis de influência, etc.) até objetivos mais “filantrópicos” (entender a natureza e o universo, solucionar um problema social ou de saúde, fornecer um ensino de boa qualidade, etc.). Há muitos parâmetros que são – ou deveriam ser – considerados no desenvolvimento profissional de um professor, os quais podem ser grosseiramente separados em termos de pesquisa, ensino e serviços à comunidade. De modo geral, a pesquisa tem, sem dúvida, mais peso na avalição e nas recompensas de um professor do que as demais atividades. Além de ser mais fácil de avaliar (número de artigos, fator de impacto, etc.), ela é usualmente o aspecto mais visível da sabedoria e do desempenho acadêmico.
Gasta-se muito tempo e esforço para preparar uma boa aula para um curso de graduação, especialmente quando é preciso desenvolver novas estratégias de ensino ao planejar uma sessão ativa. É mais fácil e mais rápido recorrer a anotações amareladas de exposições anteriores ou a uma apresentação em PowerPoint que consumiu longo tempo de preparo alguns anos atrás. Além disso, muitos professores não reconhecem a necessidade de mudança em sua sala de aula. Eles simplesmente continuam a ensinar da forma como aprenderam, sem necessidade ou justificativa para alterar a abordagem utilizada. As universidades devem não somente recompensar e promover inovações nas metodologias de ensino, mas também oferecer cursos de desenvolvimento para professores a fim de cultivar e apoiar e novas abordagens educacionais.
Inevitavelmente, a mudança será lenta, se é que vai ocorrer. Esse é um desafio crítico para a próxima década. Que comece a revolução!
Adaptado de “Will Professors Teach Differently in 10 Years?”, publicado em “The World View”, 24/02/2015 (https://www.insidehighered.com/blogs/world-view/will-professors-teach-differently-10-years)