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Publicado 27/10/2017 - 07h56
Encontros reais no mundo contemporâneo
Ao mesmo passo que a tecnologia aproxima pessoas ao facilitar em muito a comunicação (por meio de sites, redes sociais, whatsapp, instagram , aplicativos para encontros e mais) acaba também por distanciar pessoas em decorrência dessas mesmas facilidades. Uma pessoa solteira, por exemplo, encontra uma real dificuldade em migrar do virtual para o real, principalmente em um tempo acelerado como em que vivemos onde a pausa é cada vez mais rara e as possibilidades de conexões cada vez mais fartas. Vivemos um paradoxo. Estamos intensamente conectados virtualmente e mais “incomunicáveis” do que na era da bossa nova, de Tom e Vinicius, quando os encontros rolavam soltos e pensar em (um atualmente banal) telefone celular era uma grande viagem ficcional.
Hoje a tecnologia faz com que a comunicação ocorra de maneira tão veloz que acaba por ignorar o tempo presente a necessidade de se criar relações. A prática de enviar torpedos substitui a voz. Não é preciso reparar bem para perceber que a tecnologia negligencia os órgãos dos sentidos. Não é mais precisa ver ou ouvir para se comunicar. É possível ter uma conversa com alguém no escuro, sem falar ou ver, usando apenas as pontas dos dedos na tela ou no teclado. Dessa forma, vai se adiando o encontro pessoal, a troca de experiências entre duas pessoas pelos cinco sentidos. E aí, quando você encontra in loco a pessoa com quem se relaciona virtualmente para dividir uma refeição, em um espaço tridimensional, em um encontro de corpo, sentidos e alma, pode perceber – em alguns casos – que simplesmente perdeu a prática do contato ao vivo onde o vivo acontece não só em tempo real, mas em espaço real..
Já reparou como no mundo contemporâneo muitas pessoas têm facilidade para “arranjar” encontros, mas dificuldade em voltar para casa feliz depois deles? Já percebeu que muitas vezes não conseguem sustentar uma rotina de encontros por tempo suficiente? Os encontros pessoais são cada vez mais voláteis e superficiais. Talvez porque um almoço banal é capaz de criar um campo real de encontro e conexão entre as pessoas, e estamos nos desacostumando. Isso sem falar que os encontros hoje são bem diferentes dos da época da bossa nova, quando eram mais comuns e reais. Atualmente se desenvolveu um vício de comportamento de desconexão do aqui e agora tão intenso que quando as pessoas estao fisicamente juntas costumam se desconectar do que está perto e presente para se conectar com quem está longe por meio da tecnologia (usando celulares , tablets, computadores etc). E, assim, vai minguando a capacidade natural de estar no aqui e no agora, no momento presente com a pessoa ou pessoas que se encontram ao seu redor.
Esse hábito de desviar do presente usando a tecnologia é constante em encontro entre amigos, com desconhecidos, entre paqueras e mais. Em todos os casos é grave, mas no caso da paquera é ainda pior porque é no encontro que pode-se de fato conhecer a pessoa, observar a interação dela com você e com os outros e atentar para o seu próprio comportamento. É ali no ao vivo e em pessoa que acontece a importante linguagem corporal e os sinais que entregam como cada um leva a vida. É no Tetê a Tetê, na face a face, no olho no olho que verdadeira química acontece. Se vai funcionar ou não, é outro papo. Mas é essencial ouvir e ser ouvido, olhar e ser olhado, sentir o cheiro, o tato, o contato e colocar os cinco sentidos em cena e prática. Sem isso, não há como se estabelecer relações.
Acredito que toda tecnologia revolucionou os nossos caminhos para encontrarmos respostas e desenvolvermos uma melhor comunicação com o mundo ao nosso redor. Porém, a tecnologia só tem valia se funcionar a favor da vida e nos trazer mais prazer e alegria de viver as conexões reais e efetivas que nos ajudam a evoluir como espécie. Assim, o caminho para conhecer verdadeiramente alguém e poder se aprofundar é o do olho no olho, o do exercício dos cinco sentidos, da intuição, da percepção da personalidade. Só depois desta etapa, que era tão comum nos anos da bossa nova e do amor romântico, é possível construir uma relação e – quem sabe? – uma bela história.