O caminho para o perdão
Publicidade
Publicado 03/10/2017 - 07h42

O caminho para o perdão

Hoje vamos fugir um pouco da temática jurídica, para refletir um pouco sobre o ano novo judaico e o dia do perdão, que têm a ver com a Justiça divina.
Na semana que passou, viramos mais uma página do calendário judaico, entrando no ano 5778, e muitas peculiaridades podem ser apontadas nas nossas Grandes Festas. Como aprendemos com nosso professor de Judaísmo, não somos melhores, nem piores, mas somos diferentes na fé que professamos.
Para começar, o ano novo judaico tem um marco temporal diferente, eis que sua contagem remonta à criação do Mundo, com Adão e Eva. Além disso, o calendário é lunar misto, sendo que as datas sempre mudam, e os dias começam à noite, com o surgimento da primeira estrela no céu.
Entretanto, as principais diferenças residem no sentido dessas datas especiais.
Nosso ano novo, que se chama Rosh Hashaná, tem como aspecto mais relevante o início de um período intenso de reflexão, sobre o que fizemos de bom e de mau no ano que passou. Logo, não se cuida de simples festividade, voltada exclusivamente à celebração e à comilança. Pelo contrário, é um tempo que precede o dia do perdão, e que deve ser dedicado às orações e reflexões.
Entre a passagem do ano e o dia do perdão, há os chamados “Dias Temíveis” (Iamín Noraím), nos quais acreditamos que D-us começará a avaliar nosso comportamento no ano que passou, para inscrever, ou não, nossos nomes no Livro da Vida. Nesses dez dias, não podemos cometer excessos.
Chegado o dia da expiação (Iom Kipúr), surgem novas distinções. No Judaísmo, o perdão está diretamente ligado aos ideais de oração, consciência, arrependimento e reparação. Portanto, não deve ser concedido, indiscriminadamente. É um caminho difícil a ser percorrido, que impõe ao pecador diversas etapas, até que ele possa atingir a benesse maior.
Inclusive, o perdão dos males que são feitos em prejuízos de pessoas determinadas somente pode ser conferido por elas mesmas, sendo equivocado pedir que D-us perdoe, se o ofendido não perdoar, afinal o mal foi dirigido a ele, e repercutiu na sua vida, sendo justo que o perdão passe pelo alvedrio da vítima.
O toque do shofár, um chifre de carneiro, serve como uma chamada ao arrependimento e convida os judeus a se lembrar e refletir sobre as diversas ideias associadas a esses dias.
Sendo um ato de merecimento, o perdão pressupõe arrependimento e reparação, para somente assim, ser verdadeiro e qualificado pelo valor da Justiça, que deve se compatibilizar com o imperativo da misericórdia. Dizem as tradições que o Eterno tem dois tronos, um da Justiça e outro da Misericórdia, porém, não fica somente em um deles, alternando sua utilização, de acordo com as circunstâncias. Nada mais sábio.
Para concluir, o perdão não implica em esquecimento. Podemos perdoar sem esquecer aquilo que nos fizeram de mau, e podemos também encerrar relações indesejadas, sem qualquer pecado, viabilizando um ideal maior de que a vida deve sempre seguir seu rumo, sem que possamos ficar parados e estagnados em sentimentos menores de mágoa e rancor. Simbolicamente, nesse período, jogamos pedras ou migalhas de pão em água corrente, justamente, para evocar a continuidade do ciclo da vida.
Que as nossas reflexões e arrependimentos nos levem para caminhos ainda melhores nesse novo ciclo que se inicia. Desejamos um ano doce e feliz para todos os leitores, independentemente, da fé que professam, ou não, respeitando a liberdade de crença, que nos é assegurada pela Carta Magna, em seu art. 5º, inc. VI.
*Escrevemos “D-us” assim, propositadamente, em cumprimento a um dos dez mandamentos.