Gravação magnética e spintrônica - Parte I
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Publicado 23/04/2018 - 12h43

Gravação magnética e spintrônica - Parte I

No dia 07 de abril de 2018 faleceu o físico alemão Peter Grünberg, aos 78 anos. Ele foi um dos descobridores de um fenômeno conhecido como magnetoresistência gigante, e por isso ganhou o prêmio Nobel de Física em 2007, juntamente com o físico francês Albert Fert. O anúncio do prêmio em 2007 dizia: "Este ano o prêmio Nobel de Física é oferecido para a tecnologia que é usada para ler dados nos discos rígidos. É graças a essa tecnologia que tem sido possível miniaturizar discos rígidos tão radicalmente em anos recentes...”.
De fato, essa miniaturização impressionante dos discos rígidos usados em computadores, celulares e outros dispositivos eletrônicos tem sido uma conseqüência direta da descoberta do efeito chamado de magnetoresistência gigante, GMR (do inglês giant magnetoresistance), descoberto no final dos anos 1980, de maneira independente. Por tal descoberta, que já revolucionou a tecnologia de gravação magnética (e que poderá afetar outras áreas também no futuro).
No inicio dos anos 1980, a área de materiais magnéticos nanoestruturados experimentava um grande "boom" na Europa, Estados Unidos e Japão. Tanto Fert e seus colaboradores, na Universidade de Paris Sul, em Orsay, França, como Grünberg e seu grupo, no então Centro de Pesquisas Nucleares (KFA, do alemão Kernforschungsanlage), hoje Centro de Pesquisas de Jülich (FZJ), na Alemanha, dedicavam-se à física experimental na área do magnetismo de filmes finos e ultrafinos, e de multicamadas (estas, verdadeiros "big-macs", feitos com o empilhamento de camadas finíssimas de diferentes metais, magnéticos e não magnéticos).
Fert investigava o efeito da aplicação de um campo magnético na corrente elétrica através de multicamadas de ferro e cromo (amostras com varias camadas alternadas de Fe e Cr, cada uma com espessura de poucos átomos), e Grünberg estudava efeitos semelhantes no mesmo sistema Fe/Cr, mas utilizando amostras com apenas duas camadas de ferro separadas por uma fina camada de cromo (tricamadas). De maneira independente, ambos os grupos obtiveram resultados experimentais que evidenciavam uma mudança enorme na resistência elétrica em função do campo magnético aplicado [1,2]. Os valores observados chegavam a variações de até 50%, muito superiores aos valores conhecidos da magnetoresistência tradicional, apresentada por metais, e conhecida há muito tempo, que é de no máximo de aproximadamente 2%. Vale destacar que o trabalho realizado no laboratório do Prof. Fert contou com a colaboração fundamental de um pesquisador brasileiro, o Dr. Mário N. Baibich, atualmente docente do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O impacto de tal artigo foi tal que o mesmo está hoje entre os mais citados entre todos os trabalhos já publicados na revista Physical Review Letters, que é uma das mais prestigiosas revistas da física (mais de 10.500 citações em abril de 2018) [1].
O imenso potencial da magnetoresistência gigante para aplicações tecnológicas foi imediatamente percebido tanto pelos descobridores e demais pesquisadores da área quanto pela indústria de gravação magnética. Poucos anos depois, em 1996, a IBM ja lançava no mercado o primeiro disco rígido com cabeça de leitura de dados baseada no efeito GMR. Tal tecnologia tornou-se padrão para discos rígidos, e o tamanho físico dos mesmos não parou de encolher desde então, enquanto que a capacidade de armazenamento de dados (densidade de informação superficial gravada, normalmente medida em bits/polegada2) crescia continuamente. A razão para essa revolução tecnológica será discutida na próxima semana.
Ver:
[1] M.N. Baibich, J.M. Broto, A. Fert, F. Nguyen van Dau, F. Petroff, P. Eitenne, G. Creuzet, A. Friederich, and J. Chazelas, “Giant Magnetoresistance of (001)Fe/(001)Cr Magnetic Superlattices”, Phys. Rev. Lett. 61, 2472 (1988).
[2] G. Binasch, P. Grünberg, F. Saurenbach, and W. Zinn, “Enhanced magnetoresistance in layered magnetic structures with antiferromagnetic interlayer exchange”, Phys. Rev. B 39, 4828 (1989).