Apreensão de documentos pessoais essenciais (CNH, passaporte, e etc.) para quitação de dívidas civis
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Publicado 24/05/2018 - 09h36

Apreensão de documentos pessoais essenciais (CNH, passaporte, e etc.) para quitação de dívidas civis

Com efeito, depois de mais de quarenta anos em vigor, o Código de Processo Civil, então em vigor, necessitava de reformas, para se adaptar aos novos tempos, proporcionando maior agilidade, e simplicidade ao seu operador e ao jurisdicionado, este último sua razão maior de ser.
Pois bem.
Após apostar em diversas reformas pontuais, decidiu, com curiosa presteza, o legislador pátrio aprovar um novo Código de Processo Civil, no ano de 2015, e que entrou em vigor, em março de 2016. Suas promessas são de simplicidade e agilidade, que seriam, basicamente, frutos da cultura do precedente.
De maneira ousada e corajosa, o legislador “importou” institutos processuais estrangeiros, ligados ao sistema anglo-saxônico (common law), com forte valorização dos precedentes jurisprudenciais, a fim de se preservar a isonomia perante a jurisdição e a própria segurança jurídica, ambas decorrentes da previsibilidade das decisões judiciais.
Ainda não se sabe, precisamente, quais serão os reflexos práticos desse novel códex, tampouco, se efetivamente será capaz de proporcionar maior agilidade ao processo civil brasileiro, de modo a concretizar a promessa constitucional da razoável duração do processo.
Deseja-se, que seja uma inovação bem-sucedida e, para tanto, caberá aos estudiosos do Direito encontrarem as melhores interpretações possíveis, adaptando essa nova legislação à nossa realidade, para que se possa distribuir Justiça da melhor maneira ao povo brasileiro.
Nesse compasso, parece-nos muito importante o estudo dos poderes e deveres do juiz, previstos no art. 139, e incisos, do Código de Processo Civil, especialmente, a questão da atipicidade dos meios executivos nas obrigações pecuniárias, que se traduz em importante inovação.
Como se sabe, as prestações pecuniárias, tradicionalmente, estavam submetidas à execução por meio de sub-rogação, na qual o juiz procurava bens do devedor, para penhora, avaliação e alienação em hasta pública, culminando-se com a arrematação por terceiros, ou a adjudicação pelo próprio exequente-credor. Assim, o juiz apenas substituía a vontade do executado, e promovia a satisfação do crédito do exequente.
Entretanto, a partir da vigência do novo CPC, o juiz está autorizado a utilizar medidas coercitivas, indutivas, mandamentais, para forçar o executado a cumprir obrigações pecuniárias, da mesma maneira como já se fazia com as obrigações de fazer e não fazer, atualmente, com sistemática prevista nos artigos 533 e 535, ambos do CPC.
Assim, por exemplo, o juiz pode, agora, adotar medidas como a apreensão de documentos essenciais (CNH, Passaporte, etc.) para coagir o executado a adimplir suas obrigações pecuniárias, ainda que não promovam a satisfação direta e imediata do crédito.
Porém, há muitas dúvidas sobre o alcance e os limites desse novo poder, que foi outorgado aos magistrados, mas, que deve ser utilizado com prudência, excepcionalmente, sempre à luz dos postulados decorrentes do devido processo legal, notadamente, o princípio da proporcionalidade.
Enfim, especificamente, em relação à atipicidade dos meios executivos nas obrigações pecuniárias, afigura-se bastante saudável, que sejam estabelecidos parâmetros à adoção de medidas coercitivas, indutivas, e mandamentais em detrimento do executado, que deve ter a sua dignidade humana sempre preservada.
Como ressalta a doutrina, tais poderes encerram cláusula geral e diante da atipicidade de tais medidas, o juiz deve avaliar, de acordo com o caso concreto, a técnica mais adequada a ser aplicada, valendo-se do princípio da proporcionalidade, de modo que, dentre as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias, decida com base nos seguintes sub-princípios, aplicáveis de um modo geral a técnicas processuais de efetivação de decisões judiciais:
1) da adequação, no sentido de que haja a real possibilidade concreta de que o uso da medida leve ao cumprimento específico;
2) da exigibilidade, segundo o qual a medida escolhida pelo juiz deve resultar o menor prejuízo possível ao devedor, dentro do estritamente necessário para que se atinja a efetivação buscada; e
3) da proporcionalidade em sentido estrito, segundo o qual o magistrado, antes de eleger a medida, sopese as vantagens e desvantagens de sua aplicação, buscando a solução que melhor atenda aos valores em conflito1.
Assim, urge compreender bem o alcance desse novo poder-dever do juiz, trazido pelo art. 139, IV, do CPC, sempre de maneira crítica e independente, aproveitando suas inovações, todavia, rechaçando aquilo que não atende aos postulados fundamentais do devido processo legal, que deve sempre nortear a atividade hermenêutica processual.
Essas medidas, além de subsidiárias, devem ser utilizadas, excepcionalmente, em especial, para os casos em que há indícios de malícia (má-fé) do devedor, que deixa de pagar suas dívidas, mas mantém padrão de vida incompatível com seu patrimônio.