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Publicado 01/10/2018 - 10h56
Alguns Desafios do Ensino Superior
Em épocas eleitorais, não custa lembrar aos candidatos, e à população em geral, algumas questões referentes ao Ensino Superior no país, pois a formação superior de sua população é fundamental para o progresso de qualquer país. Não porque o Ensino Superior faça com que a população seja mais culta, mas sim porque ele garante uma formação mais completa, para avançar o conhecimento, e para que tenhamos um número considerável de pessoas com formação sólida para avançar a sociedade. Para que um país se desenvolva, é preciso que parte considerável de sua população tenha acesso ao Ensino Superior, seja em universidades de pesquisa como a Unicamp, faculdades, centros universitários ou institutos de tecnologia. Dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostram que, em 2014, apenas 15% da população brasileira de 25 a 64 anos possuía diploma de nível superior. Esse percentual é menor do que o da média dos países membros da OCDE, de 37%, e do que o de muitos países da América Latina. No México, por exemplo, 17% da população de 25 a 64 anos possuía diploma de nível superior em 2014. Na Argentina, o percentual era de 21%; na Colômbia e no Chile, de 22%; e na Costa Rica, de 23%. No Brasil, como em outros países, o diploma de nível superior abre caminho para empregos melhores e salários mais altos. As pessoas têm consciência disso, e é por isso que vemos muitos pais e mães se esforçarem para garantir aos filhos a oportunidade de ingressar em um curso superior.
Além da questão da universalização do ensino, temos outros problemas, relacionados com a forma de ensinar e com o acesso. Por exemplo, o Ensino Superior brasileiro é muito rígido. Os currículos são engessados e dão muita ênfase à questão dos conteúdos. Tudo isso dificulta a formação de pessoas com espírito crítico. É preciso tornar os currículos mais flexíveis, de modo que os alunos tenham facilidade para cursar disciplinas em outras universidades, para mudar de um curso para outro ou mesmo para trocar de instituição. Também é necessário que as universidades ofereçam uma formação mais ampla, que dê mais ênfase às aptidões, reduza o número de horas em sala de aula e privilegie o trabalho em equipe. É claro que os saberes técnicos são fundamentais para qualquer profissão e, por isso mesmo, devem fazer parte dos currículos das universidades. Ocorre que, nos dias de hoje, as universidades não podem se contentar em formar profissionais dotados de bons conhecimentos técnicos. A preocupação delas deve estar, acima de tudo, em formar cidadãos éticos, críticos e bem preparados para enfrentar as constantes mudanças de um mundo cada vez mais conectado e em constante mutação, no qual boa parte das profissões do futuro ainda não foi sequer inventada.
Outra consequência disso é que muitas pessoas não seguem a carreira nas áreas em que são graduadas. Isso ocorre por vários motivos. um deles tem a ver com a inflexibilidade dos currículos. Os jovens são obrigados a escolher uma carreira muito cedo, aos 17, 18 anos, muitas vezes sem o conhecimento necessário para tomar tal decisão. Não raro, eles se decepcionam com o curso escolhido, mas resolvem levá-lo até o fim, mesmo sabendo que não trabalharão posteriormente na área, por não quererem se submeter a outro exame vestibular. Se os currículos fossem mais flexíveis no que se refere à mudança de um curso para outro, o número de graduados trabalhando em sua área de formação certamente seria maior. Além disso, a vida é dinâmica, e é impossível saber por quais caminhos a vida pode nos levar. Por isso mesmo, uma formação geral mais completa é importante para poder ter flexibilidade nas escolhas e nos caminhos futuros.
Conforme o mundo avança, é natural que alguns cursos se tornem mais populares e concorridos do que outro. Estamos em plena era da comunicação digital. Não é de espantar, portanto, que o curso de midialogia esteja entre os mais concorridos do vestibular da Unicamp de 2018, atrás apenas dos tradicionais cursos de medicina, arquitetura e urbanismo, e ciências biológicas. Daqui a algumas décadas, certamente haverá outros cursos entre os mais populares. Afinal, é sabido que boa parte das profissões do futuro ainda nem foram criadas. É importante destacar, porém, que cursos menos concorridos também são importantes para o país e para a sociedade, pois buscam o avanço de conhecimento e a formação de pessoas. É essencial que universidades públicas como a Unicamp, que têm um compromisso com a formação de cidadãos éticos e com a ciência básica, continuem a oferecer cursos como esses, mesmo que o interesse por eles não seja tão grande.
Além disso, temos uma questão fundamental que é o acesso, e posteriormente as desistências que acontecem ao longo do percurso universitário. Há vários fatores que devem ser considerados, mas o fator socioeconômico é crucial. De modo geral, a qualidade do Ensino Médio no Brasil é bem maior nas escolas privadas, frequentadas, em sua maioria, por alunos de classe média e alta, do que nas escolas públicas, em que predominam alunos de nível socioeconômico mais baixo. No Ensino Superior, ocorre o inverso: em geral, a qualidade é maior nas instituições públicas do que nas privadas. Estas últimas, porém, são bem mais numerosas: em 2016, segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), havia 1.990.078 instituições públicas de Ensino Superior no país, entre universidades, faculdades, centros universitários e institutos técnicos, contra 6.058.623 instituições privadas. O resultado de tudo isso é que os jovens de famílias com maior poder aquisitivo saem do Ensino Médio com uma base mais sólida para ingressar no Ensino Superior e, também, com melhores condições de disputar uma vaga nas boas e concorridas instituições públicas do país. Os jovens de famílias mais pobres, por sua vez, acabam tendo de cursar o Ensino Superior em instituições privadas de menor qualidade, às quais chegam com uma base mais frágil de conhecimentos e habilidades. As ações afirmativas têm ajudado a elevar o número de alunos oriundos de escolas públicas que conseguem ingressar nas melhores e concorridas universidades públicas do país. Essas ações, contudo, não são suficientes para resolver o problema. É preciso elevar a qualidade do ensino oferecido nas escolas públicas em todos os níveis: Infantil, Fundamental e Médio. Sem isso, os alunos das classes menos favorecidas continuarão a sair do Ensino Médio com menores condições de ingressar e continuar nas melhores instituições públicas de Ensino Superior.
O país já avançou bastante no que se refere às políticas de inclusão, mas elas ainda são insuficientes para o acesso ao Ensino Superior. Por exemplo, dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) mostram que a quantidade de pessoas que ingressam no Ensino Superior no Brasil vem aumentando. Entre 2006 e 2016, o número de alunos ingressantes passou de aproximadamente dois milhões (1.965.314) para cerca de três milhões (2.985.644). Nesse mesmo período, o número de alunos matriculados em cursos superiores subiu de quase cinco milhões (4.944.877) para pouco mais de oito milhões (8.052.254). Um dos fatores que ajudaram a levar mais pessoas para o Ensino Superior foi o aumento da oferta de cursos online. Em 2006, os cursos online respondiam por apenas 4,2% do total de matrículas; em 2016, o percentual já havia subido para 18,6%. O número de vagas no Ensino Superior, porém, tem de aumentar ainda mais – não só em universidades de pesquisa como a Unicamp, que têm um custo muito alto, mas também em outros tipos de instituição. E sempre devemos continuamente zelar pela qualidade desses cursos, para realmente formar cidadãos capazes de enfrentar os desafios que nos reserva o futuro.